A Sacralização da Presunção na Investigação de Paternidade

Autores: Rolf Madaleno

SUMÁRIO:

  1. A prole preferida. 
  2. A prole preterida.
  3. Prole sem privilégios. 
  4. A ação de investigação de paternidade. 
  5. A sacralização da perícia do DNA.
  6. O temor da confiança em excesso.
  7. A recusa à submissão da perícia. 
  8. Negativa ao exame do DNA.
  9. Oposição ao exame do DNA. 
  10. Presunção e indício.
  11. O adágio pater is est  e a presunção.  

 

            1. A prole preferida.

                        Em tempos nem tão priscos e, portanto, ainda não apagados da memória jurídica, apresentava-se extremamente difícil e constrangedor para uma mãe representar numa ação de investigação de paternidade o seu filho gerado fora de um contexto conjugal. Era época de valor exclusivo da família formada a partir do casamento e filhos gerados das justas núpcias gozavam da presunção absoluta da sua paternidade marital. Além deste privilégio legal, a prole concebida na constância do casamento ainda adquiria diferenciada estratificação social, ao ser qualificada como filiação legítima, contrastando num degrau nitidamente degenerativo com a chamada filiação ilegítima, ou simplesmente biológica. Sutil discriminação terminológica, como se afora a filiação adotiva, todas as outras classes de descendência criadas ficticiamente pela legislação então em vigor, não tivessem evidente coincidência biológica.

                   Era tempo de entender que o preconceito deitava sobre os filhos e não sobre os pais; era tempo de saber que se a filiação ilegítima não podia ser evitada, surgindo prole de congresso extramatrimonial, de relacionamentos adúlteros e até de incesto, invariavelmente, a sociedade valorizava o brocado de que pai era quem demonstrava o casamento, fonte de natural aceitação da procriação.

                   Por obra do matrimônio os filhos do casamento legítimo eram registrados por qualquer um dos seus ascendentes, bastando comprovar o matrimônio para a incidência instantânea da presunção absoluta da filiação ser fruto do casamento.

                   Portanto, qualquer um dos genitores, requeria a inscrição do termo de nascimento no registro civil do filho havido das justas núpcias, cuja legitimidade só poderia ser impugnada diante de alguma das hipóteses consignadas no art. 340 do Código Civil[1], ou se provada a falsidade do termo de nascimento.

        2. A prole preterida.

                        No outro extremo, num tratamento de incontestável desigualdade, figurava a filiação ilegítima resultante da falta de casamento de pais que não queriam ou não podiam casar. Quando nenhum impedimento legal obstava ao matrimônio dos progenitores, a filiação era tida por natural,[2]e a paternidade poderia ser confessada voluntariamente pelo pai ao promover o registro no assento de nascimento do seu descendente, sempre que não se tratasse de prole incestuosa ou adulterina.

         Portanto, para que fosse lavrado o vínculo biológico paterno na filiação ilegítima, o oficial do registro recolhia a confissão parental do pai, que era expressa pelo ato de assinar o correlato termo de nascimento do filho, embora também houvesse a opção de lavrar escritura pública de reconhecimento de paternidade ou testamento que recolhesse o espontâneo ditado paterno de assunção da filiação extraconjugal, desde que não vinculasse uma filiação espúria. Ao filho espúrio o direito reservava uma condição jurídica inferior, vedando o artigo 358 do Código Civil o seu expresso reconhecimento, para, que em nome da coesão doméstica, não ultrajasse a família matrimonial, que deveria ser preservada a qualquer custo,[3] sobretudo, numa época de culto ao casamento vitalício e inexistência de divórcio. A propósito da lei divorcista, Zeno Veloso[4] atesta seu pioneirismo no socorro desta tão discriminada filiação, ao desestigmatizar preconceituosas classificações e assim, lacrar com a designação da mais pura igualdade  de tratamento dos vínculos de filiação.

           

         3. Prole sem privilégios.

                       Nesta nova ordem de valores a rígida isonomia dos filhos alinhou direitos materiais e sucessórios e proibiu a Constituição Federal qualquer díscrime nos vínculos parentais de filiação, quer ela advenha do casamento, de união estável, ou de núcleo monoparental. Pelo novo suporte constitucional, há garantia e prioridade à dignidade da pessoa do filho, como exige a vida social moderna que se ocupa de sepultar qualquer resquício de uma tola e odiosa discriminação da prole, como se o valor dos filhos pudesse ser medido pela pureza dos vínculos dos pais, em acentuado desprestígio à excelência exclusiva, que advém dos caracteres meramente genéticos.

       4. A ação de investigação de paternidade.

                   Obras jurídicas versando sobre o processo de investigação de paternidade e que tenham sido escritas em tempo anterior à vigente Constituição Política Brasileira, já deixam lembrança distanciada do caminho tortuoso e constrangedor de quem procurava o contencioso judicial da investigação de seu vínculo biológico paterno. Com a Carta Federal de 1988 resultou finalmente, consolidada a mais absoluta proibição de quaisquer designações discriminatórias e sobretudo, tutelou a prevalência dos interesses da descendência.

                   Vedadas quaisquer desigualdades na filiação, a antiga ênfase da paz doméstica invocada em nome da prevalência de valores presentes na família conjugal, já não mais tem nenhum poder de restringir também no casamento, a investigação judicial dos vínculos parentais.

                   É, portanto,  na atualidade, a investigação do estado de filiação, considerado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, como um direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, de quem quer pesquisar a sua origem genética materna ou paterna.

                   Marco Aurelio S. Viana [5]observa inclusive, que a expressão - sem qualquer restrição - recolhida do artigo 27 do ECA e a imprescritibilidade do direito ao reconhecimento da paternidade, não autorizam impor limite de idade para a demanda de investigação da vinculação biológica, que pode ser ajuizada a qualquer tempo, e não apenas pelo investigante, somente enquanto ele for criança ou adolescente.

                   A tudo deve ser acrescido o avanço da ciência médica, que no campo da genética desenvolveu os testes de paternidade pelo exame direto do DNA, [6]deitando por terra toda uma repetitiva tradição de respostas apresentadas na contestação judicial, passando pela negativa das relações sexuais; ou a não coincidência destas relações com o período da concepção do autor e, a preferida das defesas, tratava da pluralidade de relacionamentos sexuais atribuídos à mãe do investigante ao tempo da sua concepção, colocando em constrangedora dúvida, a fidelidade e a moralidade daquela mulher que deu à luz ao autor da ação de investigação.

                   Seguramente, era este o mais abjeto de todos os constrangimentos processuais, porque em sociedade de padrões inflexíveis de comportamento da mulher, sugerir-lhe maldosamente,  uma vida promíscua, de múltiplos parceiros, representava risco que as mulheres de boa estirpe nem sempre estavam encorajadas a correr, inibidas pela vil ameaça de ver enlameada falsamente a sua moral como pessoa e a sua dignidade  social.

                   No entretanto, devido às provas biológicas cientificamente desenvolvidas, as demandas judiciais perderam todo este encanto que a fértil imaginação, misturada à eventual realidade permitia construir, numa rica história processual sobre a vida sexual das pessoas. Maria Corona Quesada González [7]diz que a exceptio plurium concubentium operava devastadoramente contra a mulher, fazendo supor que a justiça se preocupava muito mais em sancionar a conduta da mãe, sempre num proceder processual levado em prejuízo do filho, que em última instância, era a inocente vítima do processo ou da omissão de sua investigação parental.

                   Lembra que esta linha de defesa se prestava ao abuso, e permitia sempre ao acusado, valer-se do falso testemunho de um ami complaisant, disposto a dizer impunemente,  haver mantido relações sexuais com a mãe do investigante.

                   No entanto, registram os estudiosos do direito a verdadeira reviravolta trazida pelo exame de DNA na ação de investigação de paternidade, devido ao fato deste teste ter tornado completamente obsoletos, não somente os demais exames científicos empregados na pesquisa da filiação, como também, praticamente, ignorar os demais meios de prova usualmente utilizados em processos investigativos da paternidade, como testemunhas, semelhança física e o princípio da posse de estado de filho.

                   Segundo qualificada corrente doutrinária, o valor probatório praticamente absoluto da perícia genética, torna inútil qualquer defesa que exclua a responsabilidade paterna, e esquive-se de submeter-se à perícia do DNA.[8]

                   5. A sacralização da perícia do DNA.

                   Este fantástico progresso científico de elucidar a filiação pelos marcadores genéticos do DNA, tornou-se para o consenso jurídico, em uma prova tão clara e conclusiva, que sequer aceitam os juízes progredir na instrução tradicional de uma ação de investigação de paternidade, sem antes promover todos os esforços dirigidos para a efetivação da perícia genética.

                   Decisões judiciais vêm sendo encaminhas inclusive, no sentido de a perícia genética ser ordenada de ofício pelo juiz, que atua em faixa própria de discricionaridade probatória, não dependendo da iniciativa dos litigantes. [9] 

                   A prova pericial do DNA, com os seus resultados diretos e categóricos de inclusão ou exclusão da paternidade, passou a ter um valor superior e incontestável, e tornou pelo consenso de muitos, praticamente inútil e obsoleta, qualquer outra pesquisa probatória processual. Tanto assim acontece, que seguido, cuidam os julgadores de não avançar na instrução da demanda investigativa, sem antes ordenar a realização da indispensável pesquisa da verdade biológica que entendem só poder ser revelada pelo exame do DNA.

                   Chegou-se ao extremo da minimização dos clássicos meios processuais de prova, o que pode ser facilmente deduzido das decisões jurisprudenciais sacralizando a perícia genética, como sendo a suprema das provas. Prescreve Maria Celina Bodin de Moraes [10]em preocupante vaticínio que: "a certeza científica, oferecida pelo exame de DNA, para determinação da paternidade encontra hoje um único obstáculo: a recusa do suposto pai entregar o material necessário ao teste."

                   O piloto da verdade a ser buscada, ressalta Luiz Fachin,[11]passa a ser o exame conduzido pelo médico-perito e somente a perícia do DNA poderá expungir eventual dúvida colhida com a prova testemunhal e de outros exames genéticos, arremata Belmiro Welter. [12]

                   Ao contrário senso, não havendo recusa do investigado para a coleta do material pertinente ao teste de paternidade, sobra uma única premissa de plena e irrefutável segurança no laudo genético da vinculação parental, pois não aventa nenhum outro entrave. Assim visto, embora haja significativa liberdade probatória, escorada no princípio da livre investigação, parece que coube à ciência o papel decisivo e perigosamente restritivo, de declarar a verdade biológica e do juiz homologá-la.

                   Postas estas premissas, sob qualquer outro ângulo e nem de viés prestará requisitar outras modalidades processuais de prova, porque sendo creditado valor supremo ao DNA, e sugerido que a perícia se realize até de ofício pelo juiz, para examinar a viabilidade de seguimento da demanda, as outras provas tornam-se inúteis e dispensáveis. Primeiro, porque se a resposta do laudo for de inclusão e, portanto, mostrada a viabilidade da ação, qualquer outro recurso probante passa a ser desdenhado e visto com indisfarçável desconfiança, já que ninguém e absolutamente nada, é capaz de desmentir a realidade genética que a ciência descobriu como manipular.

                   E se ao contrário, o laudo inicial for de exclusão, incide o mesmo desdém, e uma profunda e quase insuperável descrença sobre os demais meios processuais de prova, a demonstrar que a cega confiança na perícia do DNA, carrega sempre, este perigoso e deletério efeito de influenciar sobre os outros meios legítimos e lúcidos de prova judiciária.

         6.  O temor da confiança em excesso.

                   Dentro deste desenho processual, durante muito tempo os decisores cultuaram e muitos seguem endossando o valor absoluto do exame genético de DNA, mesmo à vista de equivocados laudos, que sugerem maiores cuidados com o absolutismo desta classe de prova. De outro lado, freqüentes e candentes textos de doutrina, assim como densas decisões  jurisprudenciais têm alertado continuamente para os riscos deste  verdadeiro culto à prova dos marcadores de DNA.

                   Maria de Lourdes Rachid Vaz de Almeida [13]não contesta a idoneidade técnica do exame pericial genético e nem é este o sentido deste texto, contudo, alerta para a variação de problemas que ainda interferem na prova da investigação da paternidade. É preocupação também externada por Sérgio Gischkow Pereira,[14]  em voto por ele proferido na Apelação Cível nº 595074709, onde afirma já ser hora de repensar a verdadeira sacralização e divinização do exame de DNA, alçado à fórmula milagrosa de resolução de todos os problemas pertinentes à investigação dos vínculos de filiação.

                   Já é momento de evitar o endeusamento do resultado pericial, convertido o julgador num agente homologador da perícia genética, certo de ela possuir peso infinitamente superior a de qualquer outra modalidade de prova judicial.

                   Disse isso o Des. Heitor Assis Remonti na Apelação Cível nº 596212027, que relatou na 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, contrariando neste voto o resultado negativo da prova pericial efetivada. Encerra aquele julgado, lição que retira da perícia genética de DNA a áurea do absolutismo, em que isoladamente e com exclusividade, o laudo decidia a investigatória, praticamente dispensando a atuação do juiz.[15]

                   Este culto ao resultado pericial não vem sendo compartilhado entre renomados peritos, como Anete Trachtenberg, [16]ao afirmar a falibilidade do teste de DNA, pelo fato dos laboratórios carecerem de dados estatísticos tão caros e próprios da população brasileira, composta por uma raça mista, de características singulares, divergentes dos levantamentos estatísticos realizados com os povos dos Estados Unidos e o da população européia.

                    Também observa que a certeza percentual  considerada, está condicionada à tecnologia desenvolvida pelo respectivo laboratório e que deve atender às normas e controles introduzidos e controlados pelo FBI para os laboratórios forenses por ele credenciados nos Estados Unidos.

                   Como boa quantidade de erros podem ser cometidos, Anete Trachtenberg encerra por dizer já não mais ser possível prosseguir com esta cega confiança dos juízes, promotores e advogados nos testes de DNA, que não podem ser considerados conclusivos, apenas servindo como mais um elemento probatório.

                   O cientista Alfredo Gilberto Boeira [17]também põe em preocupante dúvida os dados estatísticos organizados pelos laboratórios brasileiros que periciam o vínculo biológico através do DNA, e complementa por referir que o sistema está longe de ser um processo infalível, como defendido por seus proponentes.

     

    7. A recusa à submissão da perícia.

                   Tem sido demonstrado que os testes de DNA não estão acobertados desta certeza e segurança absoluta, que os torna, como almejam muitos decisores, em meio único e extremo de prova de vínculo biológico.

                   Não obstante este alerta processual no tocante à divinização do laudo pericial de DNA, como se fosse um teste infalível e irrefutável, ainda assim, tem sido bastante comum deparar com débeis ações de investigação aludindo temerariamente, o irrefutável nexo biológico surgido de relação recolhida de um breve intercurso sexual.

                   Não que fosse preciso existir uma sólida e inequívoca relação afetiva, para só então, haver por revestida de seriedade qualquer ação de investigação de paternidade manejada para promover uma devassa na vida e na privacidade das pessoas.

                   Uma ação judicial promovida para investigar paternidade não reconhecida voluntariamente, traz para as partes nela envolvidas, uma compreensível perturbação na sua estrutura emocional, desequilibra e interfere no relacionamento conjugal da pessoa investigada, assim como abala o seu núcleo familiar. Na hipótese do indigitado pai já haver falecido, a demanda investigativa dissemina estes mesmos efeitos desagregadores sobre os seus sucessores.

                   Também por causa disto, empreendimento processual da envergadura de uma investigação de paternidade, diante dos resultados psíquicos, ético-familiares, sociais, morais e materiais incidentes no seio das famílias envolvidas, não permite ao decisor se descurar dos meios de prova tradicionalmente disponibilizados pela garantia constitucional do contraditório.

                   Não existe ainda certeza científica que autorize ao juiz  desdenhar outro meio de prova, em atitude autoritária de veneração ao exame do DNA. Olvidar-se da investigação tradicional, para, sem maiores delongas, ordenar a imediata submissão do investigado ao exame genético, configura-se num temerário desequilíbrio dos princípios constitucionais da ampla dilação probatória.[18]

                   O devido procedimento legal aconselha que o magistrado, no quadro atual de desdivinação da famigerada prova técnica, investigue e encontre por primeiro, os subsídios de prova capazes de encorajá-lo a dar fundamentado seguimento na busca processual da anunciada paternidade, valendo-se depois de meditar sobre um conjunto mínimo de provas, da verossimilhança entre a alegativa parental e a sua possível conexão fática.

                   Ao acionado deve ser garantido o direito de promover prioritária e decisiva prova negativa da alegada paternidade, dispensando muitas das vezes, constrangedores caminhos processuais que podem ser atalhados mediante mostras simples de impossibilidade de contato físico com a mãe do investigante à época da concepção. Assim como com a audiência prévia dos testemunhos e, mesmo com diligências previamente deferidas de requisição documental, possa surgir a prova da verdadeira filiação, antes que perícia genética se transforme em juízo extremo e único de investigação parental.

                   É dogma ainda consagrado no equilibrado calor de uma demanda investigatória, que o magistrado deva seguir sendo rigoroso no exame da prova e que procure por primeiro, a credibilidade fática da alegada coincidência da concepção com a atividade sexual declinada pelo autor da ação.

                   Não se afigura nem ético e muito menos judicioso, que a pessoa demandada numa ação de investigação de paternidade possa ser aprioristicamente constrangida, sob a ameaça suprema de se tornar pai por presunção, a realizar prova pericial com preferência pré-ordenada para o teste do DNA, sem que o investigante tivesse anteriormente, logrado convencer o juiz de alguma razoável procedência de suas alegações iniciais.

                   Acontece que este precipitado sacramento do teste genético, sempre ordenado sob a sutil ameaça da presunção de paternidade pela negativa em realizá-lo, tem provocado corrosivas injustiças, já que ignoram o equilíbrio e a adequada distribuição do conjunto probatório processual.

                   É que frente à relatividade inequívoca deste falível segmento probatório, o juiz não pode se olvidar que tem até o dever de indeferir uma perícia processual quando verificar a sua mais completa inutilidade, à vista de outras provas judicialmente produzidas que desencorajam crer na procedência da ação. O juiz deve indeferir a prova pericial quando a entender inviável.[19]

                   Fugar-se das provas ditas tradicionais, por um apego insustentável ao exame técnico, dispensando-se de coletar indícios de maior segurança de processualidade da ação, é ato judicial que descarta o  princípio constitucional do devido e amplo processo legal, pois decisão limitada a esta faixa de idéias, acena com um inadmissível tarifamento das provas. Eduardo Arruda Alvim [20]refere textualmente inexistir qualquer hierarquia entre os meios judiciais de prova, devendo o juiz julgar de acordo com seu livre convencimento, motivando a sua sentença, como previsto no artigo 131 do CPC.

                   Tem sido por sinal, princípio recolhido de algumas decisões jurisprudenciais mais recentes e melhor posicionadas, como disto é exemplo a Apelação Cível nº 592104004 da 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do RS, [21]quando o seu relator aconselhou a prefacial realização de instrução probatória, com a coleta da prova testemunhal, pois que esta, muitas vezes, seria suficiente para decidir pela procedência ou improcedência da demanda.

                   Em arremate, entendia devesse ser concluída a prova oral que se agregaria aos documentos porventura ensartados ao processo, porquanto, "muitas vezes, diante da pobreza de informações, o exame será totalmente despiciente."

                   Portanto, quando se cuida de uma delicada demanda que procura investigar com o rigor devido, os vínculos genéticos que tratarão de marcar a história e a identidade do investigante e da pessoa investigada, é preciso muito mais do que prudência por parte do magistrado ao julgar a investigatória.

                   Há que ponderar que existem duas verdades no feito, sendo direito do demandado reclamar do decisor imparcialidade e cautela, preceitos que não se conciliam com o gesto processual de predileção por provas, onde tarifá-las por preferência pessoal fere princípio extremo, do devido processo legal.

                   O juiz não deve julgar antecipadamente que a prova habitual é impertinente diante do aparente resultado mágico e sacro da perícia, pois que neste movimento sempre imparcial e equilibrado de quem julga, testemunhos e depoimentos previamente coletados, não se desvestem da sua coerência num processo onde o rigor da prova é da essência na declaração do correspondente vínculo biológico de filiação.

                   De conseguinte, não coaduna com o melhor tratamento processual, compelir o investigado a promover perícia genética com o iniciar do processo, sob pena de a sua negativa servir-lhe como infactível presunção de paternidade, como recentemente decidiu a 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do RS. [22]

                   Esta sensibilidade em não superestimar uma única prova, havida por muitos como suprema e absoluta, fez Marco Aurelio S. Viana[23]advertir que não basta ao interessado na investigação de seu nexo biológico louvar-se no exame de DNA, que deve ser lido num conjunto probatório muito mais denso e verdadeiramente seguro.[24]

                   No terreno da investigação de paternidade ou mesmo da maternidade, por suas profundas repercussões sócio-familiares, e pela delicadeza de suas seqüelas psíquicas, deve o magistrado cada vez mais, tomar a extrema cautela de não permitir que processos sigam desvairadamente remexendo a vida e os sentimentos das pessoas. A prova pericial e a sua verdade científica não foi abençoada ao degrau da supremacia, ao menos enquanto não forem eliminadas as incertezas e inseguranças que ainda pesam sobre os testes de DNA produzidos no Brasil.

                    José Berdejo e Francisco Rebullida [25] chamam a atenção que este sistema da livre investigação do vínculo biológico supõe certos riscos, ao deixar à disposição de pessoas desaprensivas, uma excessiva facilidade para promoverem, às vezes artificial e infundadamente, processos que podem criar gratuitos e injustos problemas às pessoas e famílias, quando não há pretensão coativa ou chantagem. Há demandas investigativas que só vêm à tona como instrumento de denúncia de uma relação extraconjugal, como meio eleito para revanchismos do amor. Por estes fortes motivos, seguem aqueles lentes mostrando que diversas legislações têm limitado estes potenciais abusos, exigindo ab initio, um princípio de prova que dê razoável credibilidade à pretensão deduzida em juízo.

                   Por temor destes excessos, tem o autor da ação o dever primeiro, de buscar convencer o juiz de que fala a verdade e, produzir no espírito do decisor uma cômoda sensação de estar lidando com forte probabilidade de veracidade.

                   Logo, contra o bom senso e a ética, apresenta-se proceder exatamente na via inversa, para dar crédito jurídico aos fatos alegados e, depositar toda esta credibilidade na reação de negativa do investigado em querer se submeter ao exame de DNA, servindo este seu gesto, como indício absoluto de que se rebela sempre contra o teste, por ter consciência de que é o pai.

                   Conclusão de gravíssimos efeitos, porque retira do investigado até o natural impulso da indignação pessoal por ser devassado em sua vida pessoal e familiar, não sendo tolerada qualquer justificativa, senão a invariável conclusão de que o  seu gesto processual de negativa ao exame, se trata de um claro indício de procedência da paternidade.

                   Houve uma época intensa e bastante extensa de respeito sacro e único à família que oriunda do casamento, era havida como legítimo modo de sua constituição. Invertido o processo, passou a ser sacra a filiação natural, rompidas antigas e resistentes barreiras de discriminação. Portanto, mostra a história da evolução legislativa brasileira, uma constante humana do erro pelo amor ao extremo. Também houve um tempo onde o casamento fazia presumir a paternidade, e a maternidade era sempre certa. Atualmente, são conceitos relativizados, pois no terreno da filiação biológica, mesmo num cenário de altíssimas probabilidades, enquanto só aparência, nada mais comporta verossimilhança por mera presunção. Ora, se casamento e maternidade já não mais carregam o selo da incontestável verdade biológica, seria extremamente perigoso absolutizar a presunção de paternidade pelo singelo gesto processual de se negar em realizar o teste pericial do DNA.

                   E pior ainda, é que a jurisprudência tem estendido este mesmo princípio da presunção de paternidade quando a negativa de submissão aos testes de DNA parte dos parentes do suposto pai que já é falecido, ou que não se encontra disponível para o teste, como se ele mesmo estivesse se negando ao exame[26].

                   É profundamente preocupante perceber quanto está sendo divinizada agora, exatamente, a presunção da paternidade pela simples oposição de submissão ao exame do DNA, com maior gravidade quando parentes que sequer figuram no pólo passivo da ação, vêem a sua recusa fundamentar uma decisão judicial de procedência de uma ação de investigação de paternidade, cuja petição inicial não lhes foi oportunizado contestar.

                   Reside nesta disseminação da presunção como fator absoluto de decidir, sua indisfarçável e perigosa sacralização judicial , cujo cuidado com os seus excessos foi inteligentemente observado pelo Des.José Carlos Teixeira Giorgis ao despachar na Apelação Cível nº 592035257 da 8ª Câmara Cível do TJRS,  e indeferir perícia genética requerida diretamente ao Tribunal, a qual, sem prejuízo da sua importância probatória,"não poderia ofertar esperanças de juízo seguro, notadamente quando a coleta de sangue envolverá outras pessoas além dos apelantes, cuja recusa é razoável admitir-se."

     

       8. Negativa ao exame do DNA.

                   Pedro Di Lella[27]em alentada monografia respeitante à análise das provas biológicas, mostra com singular percuciência, justamente, este temor que se cristaliza com respeito à sacralização da presunção de paternidade decorrente da mera negativa do investigado ou de seus parentes, se já falecido, de se submeterem à perícia, entendendo que a recusa ao exame tem duas ordens distintas de interpretação.

                   Escreve que o investigado pode se negar a realizar o exame pericial quando invoca o direito constitucional de não submeter o seu próprio corpo a uma prova que não deseja.[28]Abstraída a questão da perícia coativa, não encerrada em nosso ordenamento jurídico, o julgador pátrio optou por interpretar esta negativa como sendo uma prova que milita contra a pessoa que exerceu o constitucional direito de resguardo da sua integridade física.

                   É extremamente perigoso interpretar a negativa ao exame como invariável presunção da paternidade ou de maternidade, pois igual princípio terminaria valendo na esfera criminal, direcionando a autoria do delito ao réu, toda vez em  que se negasse em se submeter à perícia genética. Claro que na esfera criminal será afirmado que a dúvida deve ser interpretada em favor do réu, ainda que a perícia do DNA fosse para comprovar a gravidez proveniente de estupro. Contudo, no campo da investigatória de paternidade, mostra-se exagerado e sem rigor probante algum, interpretar sempre contra o réu a sua recusa na realização do exame, mesmo quando sequer as pessoas envolvidas na perícia figuram no pólo processual passivo, como acontece quando a demanda é proposta contra a sucessão do investigado, e esta é processualmente representada pelo inventariante judicial. É cômoda a decisão que vê na recusa um suficiente indício contra o réu, num abjeto e inconciliável tarifamento das provas.

                   A presunção deve ser invocada exclusivamente no conjunto da prova, complementa Di Lella, [29]onde todos os elementos probantes puderam ser judicializados e avaliados, sem o péssimo costume, reiteradamente verificado, de tarifamento e de subestimação dos recursos usuais de prova judiciária, onde a presunção  terminou ela própria sacralizada, alçada da condição de mero indício, para o degrau sublime de comportamento processual incapaz de absolver quem se facultou da recusa em fazer o exame do DNA.

                   Interpreta o decisor os sentimentos e as emoções daquele que se nega ao exame, desapegando-se das provas judicialmente catalogadas, para formar sua convicção sobre o comportamento do investigado, firmando sua livre convicção de aparência de paternidade daquele que se esquiva da perícia. Para o julgador pouco importa seja o indigitado pai, ou os seus parentes, as pessoas que devam trazer seu material genético para perícia, sob a ameaça de a sua negativa servir como fundamento sentencial de provimento da ação, porquanto, este modo de julgar calca-se na regra comum da experiência, sobre a qual o juiz formula o seu entendimento para determinado fato. [30]

                   A negativa de submeter-se à prova biológica nada deve representar como fonte dedutiva de paternidade, enquanto não exigidos os requisitos que garantam a seriedade e a segurança destes testes científicos de filiação.

                   Por sinal, nesta linha de argumentação bem movimentou-se o Tribunal de Justiça de Minas Gerais na Apelação Cível nº 87.029/2, em julgado apontado por Marco Aurelio Viana,[31]onde fica claramente diferenciada a idéia de confiabilidade, em confronto com a de probabilidade. Confiabilidade, escreveu o Rel. Des. Bernardino Godinho "é ato subjetivo, de conteúdo muito relativo, enquanto que a certeza é a conformidade do conhecimento com a realidade da coisa que se conhece..."

                   Ainda que elevados os percentuais de inclusão parental em exames obtidos através de perícias realizadas por laboratórios cientificamente capacitados, sempre o seu resultado será discutível, por não ser absoluto. Só este aspecto já extraí a evidência de sacralizar a presunção, porquanto, a dedução judicial termina indiscutivelmente, recebendo foros ficticiamente mais eficazes do que a prova científica. Considerando esta liberdade de o juiz construir uma verdade decorrente da teoria de que o  silêncio da parte reflete uma ocultação da realidade, confere ao magistrado uma falsa sensação, de que possui como elemento de convição, um indício que considera irrefutável.

        

                9. Oposição ao exame do DNA.

                   Já tangente ao direito da pessoa investigada opor-se em realizar o exame, esta possibilidade decorre segundo Di Lella, [32]quando por motivos justificados o investigado se opõe à realização desta prova específica. E completa lembrando ser motivo justificado de oposição à perícia, quando ela não reúne requisitos suficientes de seriedade.

                   Ressente-se desta validade aquele laboratório que não garante a realização da investigação biológica por pessoal capacitado e baseada em critérios admitidos como suficientes pela ciência médica. Segundo Pedro Di Lella,[33] para que um centro possa estar credenciado para investigações sobre a paternidade, deveria ter de cumprir uma série de requisitos preestabelecidos dentre estes: utilizar três grupos distintos de marcadores (antígenos eritrocitários, H.L.A. y enzimas eritrocitárias), como visto, contar com pessoal especializado, alcançar um índice de 99% de possibilidades de exclusão e, ao menos em dois sistemas, utilizar três tipos distintos de marcadores (por exemplo: ABO, Rh e Duffy).

                   Lembra que não existe controle algum sobre os laboratórios que oferecem estes estudos, a ponto de não sabermos nem qual o pessoal especializado com que contam, onde profissionais estranhos à perícia genética, embora entendidos em áreas afins, aventuram-se neste rentável campo da perícia processual.

                   Laboratórios não possuem muitas vezes, tábuas populacionais próprias, valendo-se de estatísticas do exterior[34]. Muitos laboratórios igualmente não fornecem qualquer informação acerca destas suas estatísticas e de como chegaram às freqüências alélicas das distintas regiões deste imenso país. Chegou-se a um incrível estágio em que advogados e juízes ignoram como estão conformados os laboratórios. Alerta não existir qualquer espécie de controle ou de fiscalização das autoridades do governo, ficando relegada à confiança cegamente depositada nos laboratórios aleatoriamente habilitados perante juízes e tribunais.

                   Consoante este mesmo autor, os laboratórios devem contar com imunogenetiscistas, biólogos moleculares e especialistas em estatísticas, como justifica a complexidade dos informes individualmente pesquisados, onde cada profissional deve consignar no laudo a sua correspondente conclusão. Cada qual destes diferentes profissionais, cuja capacidade científica não pode e nem deve mais ser contestada, haverá de referir as técnicas utilizadas de acordo com a metodologia estabelecida pelo órgão público de fiscalização. Lembra que na Alemanha somente três laboratórios se acham capacitados para promover os estudos de marcadores genéticos, enquanto que no Brasil a habilitação e credenciamento sequer ocorre de modo oficial. Acresce que, embora os laboratórios manejem estatísticas populacionais não reveladas, obtidas por critérios e pesquisas também não divulgadas, muitos deles utilizam-se de dados importados de povos com outras características étnicas. Estes dados servem apenas para citar alguns dos inúmeros requisitos que devem ser rigorosamente observados, e criteriosamente seguidos por aqueles que se habilitam nestes meandros que buscam desvendar o mistério das relações parentais que continuam ocultas da realidade jurídica.

                   Por isto é oportuna a assertiva conclusiva de Pedro Di Lella [35]quando convoca a medicina a sujeitar-se aos pertinentes requerimentos de um trabalho científico, pois se ela pretende em nome da ciência auxiliar o direito,  deve então, proporcionar todos os elementos que sirvam para refutar até a exaustão as suas conclusões, porque, se: "o caminho não é ocultar as dúvidas senão, indicá-las precisamente, para que o interessado em descobrir a verdade as indague e verifique;..."

                   Deve ser havida por perícia idônea aquela que diante dos dados colhidos e da clara explicação técnica ou científica produzida pelo perito, escreve Arruda Alvim, [36]permite que as suas conclusões só restem aceitas, porque cotejadas, criticadas e discutidas até a sua completa exaustão.

                   Na atualidade, em verdade, todos creditam 99,99% de probabilidade na perícia genética, e confiam exclusivamente no perito e nos informes e estudos por ele fornecidos, sem qualquer confrontação oficial. Isto não significa colocar em dúvida cada qual dos laboratórios envolvidos com os testes judiciais de DNA e que se apresentam como estando perfeitamente aparelhados para apurar a parentalidade das pessoas. Ao contrário, pela certeza que os laboratórios apresentam quando oferecem os seus exames de determinação de paternidade pelo DNA, a extrema cautela requisitada para a sua total confiabilidade,[37]representa demonstrar que, diante da proliferação de laboratórios e da falta de critérios seguros para o seu credenciamento e da sua fiscalização, com mais razão ainda, faz perceber que não desapareceu a exigência do rigor probatório e, sobretudo, é exatamente com esteio na rigidez desta prova que a verdade não pode ser substituída pela sacramentalização da presunção.

                   Como atribuir este caráter vinculante à prova biológica, quando impera em nosso sistema processual o princípio da livre apreciação das provas.

                   Presunção, que sob nenhuma hipótese, pode ser aplicada quando escorada numa justificada oposição do investigado em se submeter ao exame, mormente quando sobre o teste nada lhe foi revelado para atestar a sua infalibilidade, em detectar o nexo biológico e a sua suposta incontestabilidade.

         10. Presunção e indício.

                   Indício e presunção não são palavras sinônimas, como bem explica Casimiro Varela, [38] para muitos autores os indícios são apenas fonte[39] de prova e não meios de prova, mas complementa, que o indício capta um fato que pode ter significação material ou humana, física ou psíquica, simples ou composta, enquanto que a presunção constitui um fato conhecido, um juízo lógico do decisor que lhe permite formar convicção sobre determinada eficácia do indício. Sergio Carlos Covello[40]também aborda as diferenças entre presunção e indício. Resumidamente, sustenta que o indício é a base da presunção, porque é do conjunto de indícios que o juiz obtém as inferências que lhe permitem presumir o fato indicado.

                   Portanto, trata-se como visto, de conceituação claramente diferenciada, onde indício e presunção se auxiliam, se complementam. Indício é a premissa menor e, a presunção a premissa maior e, ambas designam a prova indireta ou artificial. De conseguinte, se é do resultado desta operação dedutiva que o magistrado poderá chegar à presunção indireta da prova e do conseqüente reconhecimento da paternidade ou mesmo da maternidade, com efeito, que jamais poderá presumir pelo único indício da oposição ou da simples negativa em realizar o exame, que desta omissão decorra a presunção da filiação pesquisada.                  Primeiro, porque não pode haver tarifamento de provas, onde uma classe de prova possa parecer melhor do que a outra.

                   Aceitar prova taxada é impregnar o juiz do mais amplo arbítrio, pois fica comprometido o seu livre convencimento, na medida em que deve dar maior valor e avaliar com diferentes pesos a prova judicial, segundo a sua pré-classificação processual. Guilherme Nucci[41]informa representar um real retrocesso retornar ao defasado e inoperante mecanismo de avaliação da prova, que poda o juiz no raciocínio de seu livre convencimento e faz com que a sua imparcialidade fique corroída por obra da própria lei.

                   Curioso, por sinal, fica ver o decisor literalmente maneteado pela prova dentro deste sistema taxado, num processo onde só a perícia tem real credibilidade e é tida como suficiente para declarar uma paternidade, mesmo como conseqüência da recusa em realizar o exame.

                   No processo penal, não obstante prossiga a dúvida em favor do réu, eis que julga direito indisponível, tangente à liberdade da pessoa, estranhamente, este mesmo direito indisponível, perseguido na ação investigatória, faz inverter a presunção de inocência, presumindo-se a paternidade pela recusa ao teste do DNA.

                   E como visto, sendo pertinente a ação investigativa de paternidade à direito indisponível, onde estão em jogo valores humanos fundamentais, como o nome, a honra, a identidade, a personalidade e os vínculos familiares respeitantes às duas partes envolvidas no processo, jamais o magistrado poderia antecipar sua decisão por simples presunção que só beneficia ao autor investigante. Chegou-se a um estágio de um extremado rigor processual contra o investigado, enquanto nenhuma rigidez probatória é imposta ao investigante, apenas em nome da sacramentalidade ou da divindade de qualquer perícia biológica, em especial para o sistema com marcadores do DNA.

                   A negação ao exame, enquanto não fiscalizadas as técnicas periciais, segue como lícita e adequada justificativa de oposição, até porque, a presunção como prova indireta, jamais poderia chegar ao extremo rotineiramente verificado, do sopesar dos sacramentos, onde a perícia é a sublime prova, absoluta,  e recusá-la, contrariando todas as esperanças cegamente nela confiadas, termina por merecer o mesmo resultado e define a paternidade pela mera presunção de culpa.   

                   E mais grave ainda, está em constatar um inconciliável paradoxo judicial, como levanta Cecília Grosman[42], pois se não existe sanção direta para quem se nega a se submeter ao exame pericial, não é possível sancionar indiretamente o investigado por seu gesto de recusa, derivando de sua resistência um resultado contrário às pretensões que sustenta.

           11. O adágio pater is est  e a presunção.  

                   Trata-se como visto, de terreno virtualmente perigoso, este de induzir a paternidade pela recusa na realização da perícia genética. Segundo estampa Francisco Amaral,[43]as presunções não são meios de prova, mas sim, processos lógicos que se baseiam nas regras da experiência da vida e nascem da dificuldade ou até da impossibilidade da prova de certos fatos, o que obriga o juiz a contentar-se em extinguir os conflitos com indícios.

                   Assim apareceu ao longo dos anos o adágio latino pater is est quem justae nuptiae demonstrant, determinando serem legítimos os filhos nascidos na constância do matrimônio. Segundo Silvio Rodrigues[44],tal presunção está baseada naquilo que habitualmente acontece, como conseqüência da obrigação de coabitação e de fidelidade impostos como deveres do casamento.

                   É regra induvidosamente ditada para segurança da família, está prevista em lei como presunção matrimonial e, ao seu tempo e modo, ampliada na legislação civil também para as relações de concubinato.

                   Para o consagrado autor Francisco Hernandez [45]é uma regra baseada sobre uma idéia de probabilidade, que de um fato conhecido permite induzir um fato desconhecido. Vale dizer, que sobre a probabilidade dos filhos conjugais terem a paternidade do marido, foi construída a probabilidade da regra de ele ser o pai por presunção, sujeita esta mesma ilação de paternidade à prova em contrário. Cuida-se de conseguinte, de presunção simples (iuris tantum), por admitir prova em contrário, fundada naquilo que habitualmente acontece. De outra parte,  o adágio pater is est,embora admita prova em contrário num curto espaço temporal preclusivo, resulta de expressa previsão de lei e objetiva militar em favor da estabilidade e da segurança da família, para evitar a atribuição de prole adulterina à mulher casada.[46]

                   Deve o aplicador da lei, entretanto, reestimar estas mesmas probabilidades matemáticas que aplica por presunção legal, na filiação entre marido e mulher, quando se trata de concorrer com idêntica carga de indução presuntiva, quando conta apenas com a negativa do indigitado pai em se submeter ao exame do DNA, por paternidade que lhe é atribuída fora de um casamento ou mesmo de uma notória relação estável.

                   Sucede que fora desta presunção pater is est  as chances matemáticas reduzem-se assustadoramente, e nem podem carregar este preceito de imperatividade nascido de uma  crença de infalibilidade do sistema pericial de DNA.

                   Sem embargo, a atitude de uma pessoa que se opõe justificadamente a realização de exame pericial, ponderando razões de peso e falta de fé na formação técnica dos laboratórios que se habilitaram, guarda postura e comportamento processual mais do que razoáveis e legítimos ao temer que se lhe atribuam perícia com caráter vinculante, nas duas vias, quer a ela se submeta alheio à metodologia e segurança no procedimento, quer a ela se recuse, pois para as suas duas atitudes as sentenças se pronunciam com a mesma falta de prudência, sempre no afã de priorizar virtudes, ainda que lastreadas em falsas presunções.

                   E se na atualidade, não mais prevalece a presunção da paternidade pelo casamento, nem ao menos a presunção absoluta da maternidade pelo estado gestacional, não convém dentro deste contexto, deslocar esta aparência de veracidade para  presunção apenas pela negativa.

                  

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* Advogado e Professor de Direito de Família na Unisinos/RS, Presidente do IBDFAM -Instituto Brasileiro de Direito de Família, Secional do RGS, autor dos livros Direito de Família, aspectos polêmicos, e A disregard e a sua efetivação no Direito de Família, ambos publicados pela Livraria do Advogado Editora, Porto Alegre.

[1]Art. 340 do CC. A legitimidade do filho concebido na constância do casamento, ou presumido tal (arts.337 e 338), só se pode contestar, provando-se: I - Que o marido se achava fisicamente impossibilitado de coabitar com a mulher nos primeiros cento e vinte e um dias, ou mais, dos trezentos que houverem precedido ao nascimento do filho. II - Que a esse tempo estavam os cônjuge legalmente separados.

[2]GOMES, Orlando; CARNEIRO, Nelson. Do reconhecimento dos filhos adulterinos , Forense, vol. I, 1958,  p.77.

[3]Gustavo Tependino, A disciplina jurídica da filiação na perspectiva civil-constitucional , inDireito de Família Contemporâneo, coordenado por Rodrigo da Cunha Pereira, Del Rey, , 1997, p.549, diz que esta nova tábua axiológica da filiação isonômica deu cabo a "uma historia de profunda e odiosa discriminação, justificada pela proteção legislativa à chamada família legítima, a entidade familiar fundada no casamento, em detrimento dos filhos nascidos de relação extraconjugal."  e com maior propósito de resguardo da família conjugal, quando os filhos têm natureza adulterina.

[4]VELOSO, Zeno, Direito brasileiro da filiação e paternidade, Malheiros, São Paulo, 1997, p.21.

[5]VIANA, Marco Aurelio S. . Da ação de investigação de paternidade , ed. Del Rey, Belo Horizonte, 1994, p.30.

[6]Salmo Raskin, Investigação de paternidade, manual prático do DNA, ed. Juruá, Curitiba, 1998, p.21, escreve que com o advento do teste em DNA, tornou-se possível excluir os indivíduos falsamente acusados de paternidade, mas também é possível obter probabilidade de inclusão extremamente próxima de 100% e assim visto, a possibilidade de encontrar duas pessoas iguais em diversos pontos do material genético é menor do que a população atual do planeta, ficando como única exceção os gêmeos univitelinos, que têm 100% de seu DNA igual. Ver também Franklin David Rumjanek.DNA identidade e paternidade, ed. Espaço Jurídico, Rio de Janeiro, 1997 e ainda Manual para la investigación de la filiación, de Luis Verruno - Emilio J.C. Haas - Eduardo H. Raimondi - Eduardo Legaspe, ed. Abeledo-Perrot, 2ª edición, 1994, Buenos Aires. No mesmo sentido Sérgio Danilo Pena, Determinação de paternidade pelo estudo direto do DNA: estado da arte no Brasil, In Direitos de família e do menor, (Coord.) por Sálvio de Figueiredo Teixeira, Belo Horizonte, ed. Del Rey, 1993, pp.243 e ss.

[7]GONZÁLEZ, Maria Corona Quesada. Promiscuidad sexual y determinación jurídica de la paternidad, ed. Tecnos, Madrid, 1993, p.46.

[8]Zeno Veloso, ob. cit., p.108, nº 59, escreve que: " Toda a cultura, a construção doutrinária, a jurisprudência, enfim, toda a concepção sobre a prova nas ações de filiação, que tinha por base a circunstância de que a paternidade era um mistério impenetrável, sendo impossível obter-se a prova direta da mesma, passou, recentemente, por radical transformação, e um entendimento de séculos teve de ser inteiramente revisto. Com o progresso científico e a invenção do teste DNA (ácido desoxirribonucléico), a paternidade pode ser determinada com absoluta certeza,...".

[9]No AI 594.064.735, da 7ª CC do TJRS, julgado em 17.9.94, foi Relator o Des. Waldemar L. de Freitas Filho, com esta ementa:" PROVA PERICIAL - Liberdade de determinação - Ainda que o Juiz não tenha determinado a perícia hematológica no despacho saneador, pode reabrir, posteriormente, e determinar a realização desta prova, pois esta atitude está dentro das atribuições que lhe cabem como Juiz, que é quem tem de decidir. DNA - O DNA fornece prova de certeza em 99,99% dos casos em que se afirma a paternidade e 100% nos em que se nega." Acórdão inserto no 3º volume do livro Direito de Família, aspectos constitucionais, civis e processuais, ed. Revista dos Tribunais, coord. por Teresa Arruda Alvim Wambier e Alexandre Alves Lazzarini, p.528. Foi esta a mesma linha de conclusão do STJ, no Recurso Especial 43.467, de MG,  4ª Turma, sendo Relator o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, publicado na obra Investigação de paternidade, série jurisprudência, da ADCOAS, ed. Esplanada, 2ª ed., 1997, p.195: "Direitos Civil e Processual Civil. Investigação de Paternidade. Determinação de Ofício de Audiência de Testemunhas. Possibilidade. Direito Indisponível. Art. 130, CPC. Direito de Família. Evolução. Hermenêutica. Precedentes. Recurso Desacolhido. I- Na fase atual da evolução do Direito de Família, é injustificável o fetichismo de normas ultrapassadas em detrimento da verdade real, sobretudo quando em prejuízo de legítimos interesses de menor. II- Diante do cada vez maior sentido publicista que se tem atribuído ao processo contemporâneo, o juiz deixou de ser mero espectador inerte da batalha judicial, passando a assumir uma posição ativa que lhe permite, dentre outras prerrogativas, determinar a produção de provas, desde que o faça, é certo, com imparcialidade e resguardando o princípio do contraditório.  III- Tem o julgador iniciativa probatória quando presentes razões de ordem pública e igualitária, como por exemplo, quando se esteja diante de causa que tenha por objeto direito indisponível ( ações de estado), ou quando o julgador, em face das provas produzidas, se encontre em estado de perplexidade ou, ainda, quando haja significativa desproporção econômica ou sócio-cultural entre as partes."

[10]MORAES, Maria Celina Bodin de.Recusa à realização do exame de DNA na investigação de paternidade e direitos da personalidade , in A nova família: problemas e perspectivas, (Org.) Vicente Barreto, ed. Renovar, Rio de Janeiro, 1997, p.184.

[11]FACHIN, Luiz Edson.Da paternidade, relação biológica e afetiva, ed. Del Rey, Belo Horizonte, 1996, p.76.

[12]WELTER, Belmiro Pedro.Investigação de paternidade - obrigatoriedade do exame genético  de DNA, in Revista Jurídica, ed. Síntese, 1998,vol.246, p.09.Segundo Welter, na página 11 deste seu artigo, o Poder Judiciário deve determinar a formatação do exame DNA, porque "não estará examinando, como o MP, a viabilidade da ação investigatória, e sim dizendo se o autor tem, ou não, o direito natural à personalidade."

[13]ALMEIDA, Maria de Lourdes Rachid Vaz de. O DNA e a prova na ação de investigação de paternidade , in Direito de Família, aspectos constitucionais, civis e processuais, ed. Revista dos Tribunais, 1996, coord. por Teresa Arruda Alvim Wambier e Alexandre Alves Lazzarini, p.136.

[14]O mesmo encaminhamento de voto procedeu na Apelação Cível nº 595085994, com esta ementa: "Investigação de paternidade. Sentença nula. Perícia. Anula-se a sentença, por cerceamento probatório, quando, requerida com insistência perícia junto ao Departamento Médico Judiciário, no devido tempo, termina ela por não se realizar, apesar do restabelecimento do serviço de perícias naquele local. Tal deliberação nada tem a ver com a censurável sacralização das perícias técnicas em ações de investigação de paternidade, que dominou os tribunais durante bastante tempo, e começa a ser revista.

[15]RJTJRS nº 184/262.

[16]TRACHTENBERG, Anete. O poder e as limitações dos testes sangüíneos na determinação de paternidade, Revista Ajuris, Porto Alegre, nº 63, pp.324/333.

[17]BOEIRA, Alfredo Gilberto. O perfil de DNA como prova judicial - uma revisão crítica , RT 714, p.296.

[18]Segundo Célio Silva Costa, A interpretação constitucional e os direitos e garantias fundamentais na Constituição de 1988, ed. Liber Juris, 1992, Rio de Janeiro, p.308: "Como quem tem os fins tem os meios, todos os meios lícitos, a ampla defesa inclui necessariamente todos os atos processuais conexos ou recursos pertinentes, com a advertência, quanto a isso, de que defesa mais se amplia do que se restringe. Do contrário, incidir-se-ia no cerceio de defesa , que, parizado à negativa de defesa, levaria à nulidade processual."

[19]ALVIM, Arruda.Manual de Direito Processual Civil, vol.2, ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 5ª edição, 1996, p.520.

[20]ALVIM, Eduardo Arruda.Curso de Direito Processual Civil, vol. 1, ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1998, p.557.

[21]RJTJRS 161/308.

[22]"Investigação de paternidade.1. Recusa à submissão ao exame de determinadores genéticos. Valoração. A recusa à submissão ao exame de determinadores genéticos deve ser valorada em desfavor do investigado, representando mais um indício positivo quanto à paternidade. Precedentes jurisprudenciais..."Apelação Cível nº 597145713 - 7ª CC, Rel. Des. Eliseu Gomes Torres, RJTJRS 187/290

[23]VIANA, Marco Aurelio S..Alimentos, ação de investigação de paternidade e maternidade, ed. Del Rey, 1998, Belo Horizonte, p.27.

[24]Na Apelação Cível nº 596060012, da 7ª CC, publicada na RJTJRS nº 179/347, o Rel. Des.Paulo Heerdt referiu que o exame pericial não tem caráter absoluto, embora seja importante fator de convencimento quando aliado às demais provas dos autos. Este entendimento da prova precisar vir da soma dos elementos de demonstração da verdade alegada, foi absorvida na Apelação Cível nº 596129692, da 8ª CC, publicada na RJTJRS, ao concluir que: "Investigação de paternidade cumulada com petição de herança. Prova testemunhal, documental e pericial em seu conjunto a indicar, com segurança, a paternidade do suposto pai, há que se confirmá-la. Recurso improvido."

[25]BERDEJO, Jose Luis Lacruz; REBULLIDA, Francisco de Assis Sancho. Elementos de Derecho Civil, IV, Derecho de Familia, Bosch Editor, Barcelona, 1989, p.55.

[26]Decisão de profundo e insustentável risco, haver por presumida a paternidade pela simples recusa dos parentes em submeterem-se ao teste do DNA em um processo que sequer figuram como parte.Começa que poderiam alguns manifestar a sua recusa e outros não, prejudicando a certeza e maior credibilidade do exame, porquanto, sabido que o êxito na definição da vinculação genética, através da reconstrução reversa da árvore genealógica, reclama o maior número possível de descendentes vivos que compõem a família original, conforme escreve João Lélio Peake de Mattos Filho (Investigação de paternidade com suposto pai falecido - atualização médico-pericial - descrição dos primeiros casos brasileiros empregando o exame do DNA - possibilidades e limitações, RT 722/361).

[27]LELLA, Pedro Di. Paternidad y pruebas biológicas, ediciones Depalma, Buenos Aires, 1997, pp.61 e ss.

[28]Existem alguns sistemas jurídicos que impõem à força a submissão da prova biológica, em comando ao direito prevalente da personalidade do investigante. Assim é por exemplo, na Alemanha, na Dinamarca, Áustria e em alguns estados da América do Norte.

[29]LELLA, Pedro Di. Paternidad y..., ob. cit., p.65.

[30]Para Isolde Favaretto.Comportamento processual das partes como meio de prova, Livraria Editora Acadêmica,1993, Porto Alegre, pp.55/56 : "Mas a aplicação dessa norma de experiência deve ser bem medida, bem pensada e, sobretudo, o seu aproveitamento, deve ser cauteloso.Assim, pela circunstância que envolve os vários elementos chegados ao processo, entre os quais o comportamento da parte através de seu procurador, se torna difícil às vezes, a aplicabilidade da chamada norma de experiência em alguns casos, em base da qual se opera a forma dedutiva do fato a ser provado. Considerando, então, o comportamento processual das partes como fonte de presunção, não se pode afirmar que essa regra de experiência seja uma prova plenamente eficaz."

[31]VIANA, Marco Aurelio S..Alimentos, ação de investigação..., ob. cit., p.29, nota 18 de rodapé.

[32]LELLA, Pedro Di., ob. cit., p.67.

[33]idem, ob. cit., p.39.

[34]Neste sentido ver Alfredo Gilberto Boeira, O perfil de DNA como prova judicial - uma revisão crítica, RT 714/ 293, onde informa que: "os dados referentes aos latinos-americanos (ditos "hispânicos") provêm de grupos da Califórnia do Sul e da Flórida - não há nenhuma segurança de que representem efetivamente os habitantes das Américas Central e do Sul ou da região antilhana." E arremata na p.296, para dizer que: "as bases de dados em que se baseiam as afirmações estatísticas ou não existem ou são pouco confiáveis, e deveriam ser analisadas sempre que esta prova for apresentada."

[35]Ibidem, ob. cit., p.49.

[36]ALVIM, Arruda. ob., cit., p.524. Francisco Maia Neto,Da prova pericial, Del Rey, Belo Horizonte, 1998, p.02, destaca ser fundamental que os fatos sejam analisados com profundidade, não pairando quaisquer dúvidas sobre as conclusões obtidas.

[37]PENA,Sérgio D.J. .Determinação de paternidade pelo estudo direto do DNA: estado da arte no Brasil, in  Direitos de família e do menor, (coord.) Sálvio de Figueiredo Teixeira, ed. Del Rey, Belo Horizonte, 3ª edição, 1993, p.257, diz que: "A Associação Americana de Bancos de Sangue estabeleceu normas rígidas para credenciamento, nos Estados Unidos, dos laboratórios que fazem exames de determinação de paternidade pelo DNA.Essas normas estipulam a metodologia de coleta das amostras de sangue e identificação das pessoas, os procedimentos de realização dos exames e de controle de qualidade, e as informações que devem constar do laudo pericial."

[38]VARELA, Casimiro A. .Valoración de la prueba, ed. Astrea, Buenos Aires, 1990, p.115.

[39]Dentre estes autores figura Héctor E. Leguisamón, Las presunciones judiciales y los indicios, ed. Depalma, Buenos Aires, 1991, p.69, que se inclina por atribuir aos indícios o caráter de fonte de presunções judiciais, já que os indícios são os que sustentam as presunções, constituindo-se portanto, em sua fonte.

[40]COVELLO, Sergio Carlos. A presunção em matéria civil, ed. Saraiva, São Paulo, 1993, pp.116/119.

[41]NUCCI, Guilherme de Souza.O valor da confissão como meio de prova no Processo Penal, ed. RT, São Paulo, 1997, p.70.

[42]GROSMAN, Cecilia P..Acción de impugnación de la paternidad del marido, Editorial Ábaco de Rodolfo Depalma, Buenos Aires, 1982, pp.182/183, em nota de rodapé nº 46, citando duas decisões judiciais.

[43]AMARAL, Francisco. Direito Civil introdução, ed.Renovar, Rio de Janeiro, 1998, 2ª ed., p.393.

[44]RODRIGUES, Silvio.Direito Civil, Direito de Família ,Saraiva, São Paulo, 1989, vol. VI, 16ª edição, p.291.

[45]HERNANDEZ, Francisco Rivero.La presuncion de paternidad legitima, Editorial Tecnos, Madrid,1971,p.303.

[46]RODRIGUES, Silvio, ob. e p. cit.